Como da última vez, resolvi colocar mais um pedaço do diário de Anita, que surdamente sofre. Em forma de contos, tenho certeza que estas passagens do diário serão muito mais do agrado das mulheres do que dos homens.
Solidão
"Eu gostaria de saber quem foi que inventou esse negócio de
que todo ser humano tem que ser iniciado no amor desde...sei lá, desde
que
nasceu, desde já!" pensava a jovem Anita Pádua consigo mesma ao
observar uma garota
de 13 anos junto com um menino, em uma festa de alguma debutante da qual ela
não lembrava o
nome, filha de algum primo de seu pai... "até um garoto de dez anos ao
ser perguntado se já beijou sabe que para preservar-se do perigo tem que
responder
'sim'. Enquanto isso, eu fico aqui a deriva...".
Anita estava sentada em uma mesa para quatro, só que
sozinha. Ela olhava ao redor e via as pessoas dançando, porém
não se sentia tentada. O pessoal era mais novo. O grupo dos adultos
também não lhe seduzia. Ela não queria falar sobre a
promoção do senhor seu pai. Estava na verdade intrigada sobre em
que
ponto ela se perdeu. Em que ponto ela deixou de ser como as outras pessoas,
deixou de seguir seus ritmos e passos. Passos?! dependendo de como for
não é uma coisa exatamente boa seguir os passos dos outros, isso
ela sabia. Tinha a certeza de que tinha que trilhar o seu próprio
caminho.
Enquanto estava a divagar, ela começou a imaginar-se
conversando com um ser que não era desse mundo, um ser encantado que
não deveria estar lá a não ser por força de magia.
Este ser de outro mundo lembrava e muito o tipo cortês e charmoso. Era
dono de uma gravata negra que lhe concedia um ar de
requinte, logo Anita se apaixonou.
- Olá, como vai?
- Bem, obrigada - respondeu a garota.
- Posso ficar aqui com você? Não me sinto bem no meio de
tanta gente...
- Ah, eu também não. Na verdade eu nem queria estar aqui.
- Eu te entendo. Gostaria de compartilhar uma coisa com você,
será que posso?
- Mas é claro!
- Eu não tenho nunca tive ninguém.
- Mas você é tão bonito.
- Eu só sirvo para afastar as pessoas... - disse o pequeno ser -
você é quem é bela.
- Mas eu não sou perfeita.
- Eu não me importo.
Anita sentiu uma espécie de calafrio percorrer-lhe a
espinha e se sentiu simplesmente...bem! Diante da nova sensação
ela se resguardou, para preservar-se de quem a queria.
- Só uma pergunta.
- Diga - disse Anita.
- Por que não se acha bela?
- Eu...não sei - acabava de perceber a garota - eu sou
muito diferente. A palidez do meu
rosto, o formato do meu nariz...
- E você acha que isso atrapalha. Minha querida, um punhado de
coisas diferentes juntas pode muito bem ser algo belo e inédito, basta
ter harmonia! E eu vejo muito disso em você. Vamos, você não
achou que Deus deixaria tão fácil o caminho para a verdadeira
beleza, não é? Qualquer um pode ficar bonito, porém
você é irresistível, algo que quem é bonito
não é.
Nessa hora Anita começou a sorrir. Porém ela logo
acordou de seus sonhos e o estranho se foi. Lá estava ela de novo
sozinha em um espaço de cem metros quadrados cheio de mesas por todos os
lados. Olhava para um lado e para
o outro e só via as paredes de cor salmão, ladeando-a com
acortinamentos cor azul escuro e púrpura.
Anita queria morrer de vergonha. Tudo o que mais desejava era
estar em casa para descansar. Os presentes lhe disseram que seu pai estava
próximo a saída, e era para lá que ela se levantava e se
movia, em direção ao fim, não mais que merecido, daquela
noite solitária!