Insegurança
Uma moça anda solitária pelas ruas pouco iluminadas de algum bairro de São Paulo. A iluminação provêm de alguns estabelecimentos de consumo e alguns postes. Anita Pádua, 19 anos, estatura mediana e cabelos do mais puro e belo negro volta para casa com sua bolsa vermelha no colo."Uma sensação estranha toma conta de mim neste momento", refletia a moça, "sempre me deparei com essa angústia, mas sempre que ela aparece se faz nova. Parece que isso me define mais do que meu próprio nome...", enquanto Anita anda ela olha o interior de um restaurante através de uma janela e vê um grupo de pessoas sentadas ao redor de uma mesa. Uma mulher que faz parte do grupo ri escandalosamente com uma taça de champagne na mão. "Parece que me define mais do que se eu dissesse que moro com meu pai e com minha irmã...que gosto de ler..." Anita olha para a vitrine de uma loja e vê um vestido de cor salmão em um manequim e para. Seu reflexo é visto na vitrine de tão perto que ela chega. Seus olhos brilham intensamente. Sua boca se abre. Ela suspira.
"Afinal...o que me define?"
Anita acorda do transe e volta a andar na direção em que andava antes. Tem de voltar para casa, seu pai a espera. A rua que ela anda desemboca em um grande cruzamento de vias. Ela anda agora muito mais despreocupada. "Acho que desde que a mamãe se foi eu fico meio abatida", volta a refletir, "mas isso...isso é algo novo...é ruim demais, e será que ninguém além de mim sente isso?"
Após atravessar o cruzamento Anita entra em outra rua pouco iluminada. Ajusta a bolsa perto do corpo novamente e olha para os lados. A moça dobra uma esquina e após alguns metros ela chega no metrô, respirando aliviada. Anita pega o vagão mais próximo do que seria a saída na próxima estação, e como sempre acontece com todo mundo ela é encarada por todos que lá estão durante alguns segundos, porém segundos intermináveis. Ela olha para todos, entrecortando o olhar entre o chão e uma pessoa qualquer, o chão e uma pessoa qualquer, ao cabo do que ela faz parte daquele ecossistema. É nesse momento que ela vê o estranho qualquer mais bonito que ela já viu, e fica se perguntando o que um sujeito desses faz no metrô. Deveria ser ator e ter um motorista particular. De qualquer maneira, seus olhares se cruzam e ela logo olha para o chão. A partida do carro é anunciada com o fechamento das portas. Anita aproveita para dar mais uma olhadinha no estranho e toda vez sempre que pode. Para sua surpresa ele também a olha. Mas olha de um jeito que ela pode jurar diferente, como quem indiferentemente gosta do que vê. Impossível. Mas Anita podia jurar que era dessa forma.
A viagem não é muito longa, e logo acaba. Nada de bom podia provir disso. Naquelas circunstâncias nenhuma abordagem podia ser tão sutil a ponto de não causar estranheza. Por parte dele é claro, pois para ela restava apenas esperar...
As portas estão prestes a abrir e quando Anita vai passar pelo estranho ela pensa: "Tomara que ele me diga alguma coisa,...qualquer coisa...". As portas se abrem, o estranho não desce mas vai em direção a uma cadeira desocupada frustrando de forma tão boba o tão desejado encontro que Anita esperava. " Ufa! Ainda bem, melhor assim...que constrangimento que seria! O que eu falaria para aquele moço caso ele dissesse alguma coisa?"
E assim, a moça solitária sai do metrô e anda em direção ao seu destino, onde tão logo irá repousar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário